Encarou o espelho como se não se conhecesse Percebeu o quanto envelhecera e estremeceu
Porque tanto tempo em tanta existência?
Será algum tipo de punição ou penitência?
Só se sabe que depois daqueles reflexos embriagados, tudo o que tinha parecia durar mais. Porque o medo do fim tem lá suas vantagens. Faz o homem mais rude cair em prantos de remorso. Faz a frieza da relação acabar em dois tempos. Mas nada ninguém pode querer voltar. Só cabe aceitar.
Nunca acreditei que pudesse ser real
Pensar no inimaginável é extraordinário
Segundos são eternos quando o tempo permite
São fragmentos de felicidade dentro de cada um
Assim como sorrisos bobos em comum
Parece bem pouco crível, mas existe.
Não posso resumir esse período curto
Pareço ser alguém realmente sortudo
Porque quando o tempo estava esgotando
Eu ceguei de frio, calei de medo, ouvi de surdo
Foi o quê de mais inimaginável
Desde o sorriso e pele impecável
À aparente frieza incalculável
Eis a bela moça excepcionalmente amável.
Chegaram os rapazes. Garçons diriam os franceses, o que é uma ótima analogia ao romance do qual trato de servir.
Trouxeram uma entrada simplista de curiosidade, entusiamo e ansiedade. Tudo estava calmo aquele dia. Atrasaram um pouco para salientar estes sabores... Ou talvez porque desencontraram do lugar combinado. A entrada já havia sido consumida, fora uma excelente introdução àquele casal que tanto queria descobrir o outro.
Logo após, trouxeram o prato principal. Era um prato bonito de interesse e encanto sincero acompanhado de timidezes interessantes. Aposto que o casal se deleitou com o prato e se satisfez com tudo o que concebera. Se dedicaram então a boas risadas e, assim como os franceses, viram uma história que se dizia ser de amor.
Por fim, a sobremesa estava servida. Depois de tantas surpresas, olhos, risos, vozes e cheiros, o casal se deliciou em um beijo suave como baunilha e intenso como noz moscada. Como bons amantes de doces, afirma-se, o mais sublime sabor da noite.
A frança invejaria aquela romântica noite. Apesar da culinária, o único alimento de que os dois trataram foi da alma, que agora estava repleta da felicidade servida por dois jovens corações. Coisa que sabemos, a França entende bem.
E não há melhor analogia do que a paixão os servindo aquela noite como garçons.
Hoje eu assoviei com força, meus pulmões queimaram sem fôlego. Mas parece que meus timbres não se comunicaram aos teus.
Eu sei que fiz mal em tentar ter-te somente em mim, mesmo estando livre, sentia-se ferido e competentemente infeliz em se contentar somente comigo.
Olá, passarinho.
A tarde caiu e não te vi por aqui, parecia que estava visitando altas cachoeiras de água fria. Seu inverno é frio demais até mesmo pra mim, que penso amar a neve.
Eu sei que sempre sonhou em tão somente voar para onde quisesse sem ter plano de pernoite.
Penso que somente fiz bem em partir, não de seguir viagem, isto foi com você, eu parti foi meu coração ao te deixar ganhar o mundo.
Olá, passarinho.
Preste atenção que hoje não digo aos bem-te-vis. Estes já chegam todas as tardes e dormem bem pertinho de mim que é quando mais preciso.
Não estes, eu hoje estou prezando a outro. A um que eu não tive em gaiola alguma, mas que pensou que o mundo era pequeno demais e quis explorar novas paisagens.
Olá, Passarinho.
Tudo que eu quis saber sobre você hoje era se ainda se lembrava de qualquer companheiro fiel que já estivera em pleno voo em sua companhia.
Olá, Passarinho.
Talvez se lembre, talvez queira esquecer, porque quando enfim decidiu dobrar o vento, ganhar os céus e seguir pra longe, percebi que eu não estava a voar. Agora eu era árvore já grande, que não olhei pra baixo pra perceber que não era eu quem me movia, mas sim as nuvens sorrateiras que me confundiram.
Olá, Passarinho.
Espero que minhas piadas sejam suficientemente boas para ainda te fazer sorrir, para que eu possa também me enganar e me ver eu seu riso uma última vez, Para que não me veja espelhando esses tristes textos em outras tristes lágrimas.
Olá, Passarinho.
Somente não esqueça que eu não sei flutuar, estou enraizado aqui, e como árvore velha, somente recebo bons amigos, que se alimentam do melhor que tenho e depois ganham o mundo em felicidade. Me deixando com o amargo da despedida e os restos de doces frutos.
Se ao menos quisesse um pouco de sombra, eu saberia como oferecer.
Mas que pretexto tenho eu
Ser alguém de luz em meio ao breu
Do escuro mais sólido acostumei
Que de toda culpa há o meu nome
E cada erro teu tem outro meu
Sei que deveria ser
Mas já não sei viver espera
Ao lado teu somente eu
Mas não posso crer
Que você ainda é aquela
Que a gente viveu
Tenho doces dedos longos
Saboreio o próprio beijo
Aproveito todo o ensejo
Porque em versos bobos
Jogo fora o que era meu
E essa tua ausência forçada
Só me faz ferir profundo
O que machuca, mata
Só pra conhecer o mundo
Não percebe como me trata
Sabemos que um dia isso acaba
Mas, no entanto quero que saiba
Que eu sinto muita falta.
Portanto, prefiro abrir mão de seu egoísmo
Dou adeus aos lamentos teus
Coloco junto deles os meus
Não lamento seu cinismo
Nos meus olhos não têm cisco
Isso dói bem mais que um corte
Não é algo muito nobre
Ter tão pouco e tanta sorte
Dessa vez peço, não volte.
Pois com esta dor já me acostumei
Dormi pouco e já acordei
Tive muito pra dizer
Você quis me emudecer
Mas agora me calei.